Não fosse a severidade das montanhas, Que me aponta A sinuosidade do caminho, Ter-me-ia chegado à nascente Apaziguadora de todas as sedes. A intermitência do desejo Salva-me de uma secura Mortalmente avassaladora. Ainda não desisti de escalar Os aclives da hesitação, Para matar a minha sede Fomentadora de todas as minhas Silentes angústias.
Antes que chegasses, encostei ao coração a memória imaginada do teu rosto. E comecei a amar-te quando disseste, em segredo, quanta neve caiu sobre o teu peito. Agora tudo será indelével nas palavras que me dizes.
Graça Pires Em 'Quando as estevas entraram no poema'. Foto Daniel Oliveira
Lamento que da tua boca sobressaiam silêncios; que nos teus olhos desenhem-se miragens. Só me resta extrair dos teus dedos o contorno preciso das linhas de afeto que sublinham vivências desenhadas pela cumplicidade dos anseios.
Compreendo a melancolia Do nascente que sepulta, A cada velho dia, Os últimos raios de luz Num poente instante. As manhãs renascem Para morrerem lentamente No ocaso de todo dia. Elas ensaiam, Bem diante dos nossos olhos, O momento derradeiro. É quando tudo torna-se finito, Efêmero, Sem a mínima chance de absolvição.
Minhas mãos me doem O caminho, Calejam-me a caneta De dedos de insistência. A direção que me aponta O papel é trajeto único, Caminho sem volta, Volta sem caminho, Percurso sem curso, Caminho que se desfaz, Descaminho. Quedo do cansaço, Visto que sobre mim, Ele caminha E com palavras pisa-me O itinerário de pensamentos; Sem remetente, Sem destinatário, Mas com um guia de persistências.
Elizabeth F de Oliveira Foto Descaminho/Márcio Negrão
A certeza que carrego, Marcada a fogo, Dentro de mim, Ampara-me a ansiedade da espera. Não fossem os teus olhos, Que me preconizam promessas, Ter-me-ia perdido No redemoinho de incertezas. O meu caminho de espera, Eu mesma traço, Reinventando sonhos Até a tua chegada.
Recrutei os teus olhos para que ficassem de prontidão da minha observância. São eles que iluminam-me o caminho de vivências, preteridas na insuficiência do tempo. São eles que focam a minha busca, mobilizando-me os anseios no caminho da realização. São eles, na verdade, os teus olhos, que me recrutam, para travar de saudade a batalha de se me refletir.
Elizabeth F de Oliveira Foto: autoria desconhecida
À luz da penumbra silenciosa da noite, tento repousar os anseios que me trafegam o sangue de ausências. Nesse percurso gravado por solitárias pegadas, ouço passos uníssonos aos meus. Eis que surge um cavaleiro andante, que com sua pena reescreve-me as páginas já viradas de solidão, contornando de palavras e preenchendo com metáforas os espaços dos devaneios habitados pelo branco. Nesse instante, sua mão entrelaça de vontade a minha.
Ainda me resta Um pouco de poesia Nas mãos tatuadas de desejo. A caneta que resvala Por entre os dedos Não sacia a ânsia Do toque das linhas do teu rosto Ou do contorno das tuas mãos. A necessidade que me consome As mãos cria em mim Um vazio eterno de solidão. A poesia que ainda me resta Inflama-me as palmas, Ansiando-me resgatar da impossibilidade Do preenchimento do desejo.
Peregrino no deserto da saudade Em busca de um oásis Que me flagre os sentidos, Que me resgate do padecimento Da espera. Habito a aridez do sentimento, À procura de uma miragem Que me mate a sede dos olhos E da boca. Esse deserto ilusório e real É o meu saara de sal Encoberto por areias de saudade. Sou peregrina da emoção, Beduína da espera do oásis Dos teus olhos.
O fascínio dos teus olhos Retesa-me as pálpebras, congeladas na excitação do sentimento. Dispo-me o olhar , para que a nudez embriague de delírio o instante em que se tocam as retinas, preenchendo a necessidade mútua do toque de afeto das mãos; enlevo primeiro da reciprocidade do desejo velado na penumbra das pupilas.
O teu silêncio adormece-me o sentido das palavras, entorpece-me a semântica de viver; e na eternidade atemporal, mantém-me desperta a saudade latente. O teu silêncio persiste em ausências, ecoando em mim o teu chamamento reticente.
Meus olhos peregrinam A lembrança da tua presença. Reclusos dos teus olhos, Eles tateiam solidão Na escuridão da saudade, Sem saber onde colocar os passos. Mal acostumados com a luz das tuas retinas, Meus olhos se perdem Em um lugar onde não se faz caminho, Sem a remota possibilidade de reencontro.
Não sei quantas luas Ainda hei de aguardar Nas noites em que me pesam As estrelas. Nessas horas, O firmamento me ofusca A retina do sentimento E me recobra Os sentidos de amargura, Refletindo-me de vazios Espelhados de solidão.
A vida me amanhece Pesando os minutos de se permitir. Não sei se lá fora o sol Se levanta guardando em si Um propósito de realização Ou se as horas que se aguardam Na senda do existir São fios de vivência que subsistem No caos ardente das emoções.
Somente tuas mãos são capazes de atenuar a dor que me excede por entre os dedos. Somente o teu abraço pode devolver-me o equilíbrio absente, esquecido no caminho extenuado do sentimento. Eu te preciso-me nos minutos da vida; visto que eu-metade, sozinha, não me faço inteira, só me faço saudade.
Em águas escuras de saudade, navego una, por entre a paisagem semântica do meu sentimento. Deslizo sobre uma emoção espelhada de verdades veladas. O barco que me conduz me naufraga e me resgata na sendas incendiadas pelo verde que se dilata em minha retina. Una, eu e o rio, solitários e perdidos em algum braço esquecido de navegação. Una, eu me reflito, nessa águas que me conduzem ao coração.
Elizabeth F. de Oliveira Foto: Cássia C. Lopes Rio Una em Morros- MA
Dedilho no violão a inocência presente na infância. Tento buscar na sonoridade das cordas as notas que deram o tom perfeito aos sonhos que um dia alimentei. Quando tocar uma canção, estarei dedilhando os anseios dos acordes perdidos na inconsequência do tempo.
Noite aqui No calor do sol O lugar mais distante dessa terra Quem virá Dar a luz à luz Na canção que atravessa o mar de estrelas E vem se aninhar Onde a dor jamais penetra?
Onde estás, no silêncio das fogueiras?
Noite em mim Longe de você Onde o sol se perdeu da primavera Quem virá Florescer a flor Um amor que atravessa a longa espera E vem se revelar O que a dor jamais revela?
Vem me abraçar Onde a dor jamais penetrará Pois o amor é labirinto de caminhos Que se encontram...
Música de Flávio Venturini e Juca Filho CD Beija-flor
Seminua, A caneta se insinua Transparente Em um aparente Jogo de sedução. Promete plena satisfação E momentos intermináveis De prazer. Como sempre obediente, Sinto que vou aquiescer E me render totalmente; Para que entre os lençóis da cama, Chegue então ao nirvana Por ter-me de todo sucumbido. E ao raiar do dia, Não terei me arrependido Por entregar-me à poesia Nesse amor tão desmedido.
Todos me falam de ti com palavras ambíguas. Fui, eu sei, uma suspeita de luz em teu olhar. Virados a levante, os meus cabelos eram labaredas em teus dedos. Na hora do combate me nomeavas, como se rezasses. Pinto-a na minha imaginação como a desejo, tanto na beleza como na nobreza, disseste. E vejo a minha expressão na cor dos teus olhos. Tão cúmplice, eu, de tamanho assombro.
O violino É meu instrumento predileto, É por ele que dissemino Todo o meu afeto; É com ele que afino As notas da minha existência E já escrevo com veemência Na partitura da vida. Não importa se a clave É de Sol ou de Fa, Sempre vai ter lugar Para o que tiver bom som. Quando estiver incorreto, Eu corrijo o tom Dos bemóis e sustenidos da vida, Que um dia foi bem mais dolorida Por não estar no compasso correto. Ao tocar a primeira canção, Transformei meu sonho em realidade E tornei-me composição Para minha perplexidade.
Os flamboaiãs tecem um sopro de cores, de partituras vivas a incandescerem o azul, o incêndio da manhã aberta. Todo o esquecimento, as ruínas e os escombros do vivido, o fracasso de não reter as semeaduras e os ventos, silenciaram-se, súbitos, ante essa floração mais viva que o tempo. Os flamboaiãs ensinam-me a não morrer, a pulsar mais que a efêmera passagem dos barcos, dos pássaros em perene exílio. Inscrevo-me nesse pólen, nessas chamas a inaugurarem uma luz mais plena que a do sol. Batizo-me nos galhos onde principiam os astros e os quatro pontos cardeais. Os flamboaiãs tecem, em mim, um outro tempo, instante vivo de todas as florações.
Alexandre Bonafim www.arquipelagodosilencio.blogspot.com Foto Fernando Gabeira
As tuas palavras Cruzaram um oceano de espera E declamaram em mim Versos do teu entendimento, Da tua poesia de viver; ecos sentidos nos quatro cantos da minha alma.
Um poema inacabado É sempre muito frustrante, Ter que deixá-lo de lado Porque a inspiração, (Companheira constante) Num gesto de insubordinação, Preferiu a vida itinerante E mudou de coração. O papel ficou jogado E o possível poema (não terminado) foi então abandonado. Perdeu-se o tema.
Assombra-me o sentimento As paisagens semânticas do teu universo. Perco-me nas curvas metafóricas Pontilhadas diligentemente Com a caneta da tua emoção. Afogo-me nas correntezas Das tuas palavras tão plenas De uma significação oculta, Mas transparente. Aquieto-me quando finalmente Consigo fundir-me com teu Emaranhado poético.
Chove purpuramente No meu quintal Flores em fragmento. Poesia visual Só para o meu alento; Vestígios da estação, Cobertor de sentimento, Que se deita sobre o chão, Cobrindo a poeira do vento. Por isso, cruzo os dedos, Para que caia mais flor E revele todos os segredos Da poesia púrpura do Criador.
Debruçada sobre madrugadas vazias, Ausentes de pensamentos, rimas e sonhos, Repouso sobre a esterilidade do nada; Enlevo único entre sombras, Restos de luz e matizes de solidão.
Dobra que dobra, redobra. Põe de pé, puxa as pontas. Não fica perfeito, mas faz de conta; um pouco torto, mas ninguém vê. Não faz mal: é só um pedaço morto de folha de jornal. Ficou de lado, meio largado na gaveta. Ao voltar, as letras de papel terão voado. Palavra mal guardada acaba se tornando borboleta.
É à beira de uma fonte Que junto as idéias, Rego as azaléias do meu coração. Essa fonte de inspiração, É somente uma ponte, Talvez seja um pretexto Para eu captar um tema, Colocá-lo em um contexto E transformá-lo em poema.
Joguei minhas cartas de amor no lixo do papel reciclado. Ignoro o rumo que lhes foi dado. O fato é que não me surpreendo, se acaso encontro um coração batendo dentro de uma caixa de sapato.